Os países da Europa ocidental e da América do Norte, que formam o grupo conhecido como “Norte global”, foram os primeiros a desenvolver uma economia focada nas indústrias. Por isso, são historicamente aqueles que mais poluíram a atmosfera do planeta com a queima de petróleo, gás e carvão.
É natural, portanto, que essas nações sejam cobradas a uma responsabilidade maior nas negociações internacionais das conferências das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas.

Na COP30 do Brasil, essa cobrança ganhou ainda mais força — tanto nas mesas de negociação quanto nas grandes manifestações populares que ocorrem em paralelo à conferência.
Talvez por isso, o chanceler da Alemanha Friedrich Merz tenha se sentido tão aliviado ao voltar para o país dele após a Cúpula de Líderes — reunião de presidentes e chefes de Estado de mais de cem países, realizada na semana anterior à Conferência do Clima.

Foto: Agência France Press.
A forma como o chanceler da Alemanha Friedrich Merz se referiu a Belém após passagem dele pela capital paraense certamente merece muitos adjetivos: preconceituosa, xenófoba, revoltante, para citar alguns.
Mas eu não chamaria essa declaração de “surpreendente”.
Eu sei que nós brasileiros temos a impressão de que os alemães (e os europeus, em geral) são um povo muito culto e instruído. A verdade, no entanto, é que muita gente do Velho Mundo em geral não conhece as razões históricas que fizeram da Europa ocidental uma região próspera, enquanto a maior parte do planeta sofre com pobreza e precariedade.
O europeu médio não percebe que essas duas realidades são causa e consequência uma da outra.
Nota do autor
É evidente que existem europeus que têm consciência dos processos históricos mencionados neste artigo. Ao me referir à forma como o “europeu médio” pensa, estou fazendo referência ao senso comum, ao pensamento hegemônico.
Eu sei o que vocês fizeram
Os povos da Europa ocidental, depois de devastar seus próprios territórios até meados do século XV, encontraram um caminho bastante questionável para se desenvolverem e se tornarem grandes potências mundiais.
Esse caminho consistiu no saqueamento das riquezas naturais de outros continentes — principalmente, das Américas e da África, durante centenas de anos. E claro: isso só foi possível depois que eles exterminaram a maior parte das populações nativas, escravizando os restantes para forçá-los a realizar o trabalho duro.
Séculos depois, a estratégia mudou para o neocolonalismo — com as mais diversas formas de controle econômico, político e cultural, que perduram até os dias atuais.

O fato de o continente europeu ser próspero não é consequência do desenvolvimento “natural” de um povo supostamente “virtuoso”. Muito pelo contrário: é resultado de uma sociedade que naturalizou a violência, a guerra e a dominação contra as populações de outras culturas e territórios.
Tudo isso justificado por uma crença (bastante conveniente para eles) de que o homem caucasiano europeu seria uma espécie de “topo da cadeia evolutiva” do ser humano. De que seriam superiores às pessoas de outras etnias. De que seriam os verdadeiros “filhos de Deus” neste planeta, únicos merecedores legítimos de suas terras e riquezas.
Essa crença sempre esteve e ainda está profundamente enraizada no imaginário do europeu médio. Ela foi a base da ideologia nazista que pregava a superioridade de uma suposta “raça ariana” e levou a Alemanha a assassinar seis milhões de judeus — ainda ontem, em tempos históricos.
A mesma Alemanha desse senhor que proferiu frases extremamente ofensivas sobre Belém do Pará.
COP30: o mundo na Floresta Amazônica
Quando a capital paraense foi escolhida pelo presidente Lula para sediar a COP30, o mundo ganhou a oportunidade única: a de realizar os debates climáticos imerso em uma realidade que dialoga diretamente com os principais tópicos em negociação na Conferência do Clima.

Foto: Bruno Peres, Agência Brasil
Apesar da imensa riqueza cultural, sabemos que Belém também é uma cidade com sérios problemas estruturais. A maior parte da população vive em habitações precárias e com baixíssimo índice de saneamento. Há oferta limitada de empregos qualificados, e a renda das famílias geralmente é insuficiente para o sustento básico.
Ao mesmo tempo, a capital do Pará está cercada pela maior floresta tropical do mundo. A Amazônia é um sumidouro colossal de carbono, de modo que sua preservação é crucial nessa luta da humanidade contra a crise climática.
Os baixos índices de desenvolvimento humano, no entanto, pressionam a população em precariedade a buscar na floresta uma fonte de riqueza e de prosperidade.
Assim surge a devastação, as queimadas e a grilagem de terras — que, posteriormente, são “regularizadas” e compradas pelo agronegócio para a implantação de pastos, ou para o plantio de soja e de outras commodities.

FOTO: Bruno Peres, Agência Brasil
É por conta dessa realidade que um dos grandes objetivos do Brasil na COP30 é garantir fundos de financiamento para remunerar os povos que protegem as florestas onde vivem. O principal deles é o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês), lançado por Lula durante a Cúpula do Clima.
E já que os países do Norte global se desenvolveram às custas da emissão colossal de gases de efeito estufa em seus processos históricos de industrialização, nada mais justo que sejam eles os principais financiadores desses fundos climáticos.
Especialmente porque os países do Sul global, por sua vez, são os que estão mais vulneráveis aos desastres, que estão cada vez mais frequentes e intensos por consequência do aquecimento da atmosfera.


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